24 de junho de 2015

CRÍTICA: O Diabo, Provavelmente

Le diable probablement, 1977, Robert Bresson

Por Evandro Lira


Dificilmente algum filme me fará sentir tamanho vazio como este O Diabo, Provavelmente de Robert Bresson. E confesso que até escrever estas palavras não tenho certeza se é esse um ponto positivo ou negativo. Afinal, seria um sentimento provocado intencionalmente? Provável. Mas não torna esta experiência cinematográfica mais fácil. 


Descobrir o plot do filme também não é muito simples. Passam-se trinta minutos, que o cérebro multiplica por algum número maior que três, e você está tão envolvido quanto estava nos créditos iniciais. Diria que ler a sinopse, ou arriscar a assistir ao filme mais de uma vez, facilita sua compreensão da obra em setenta por cento. 


O mundo que Bresson nos apresenta aqui é desprovido - literalmente - de qualquer sorriso e voltado para uma descrença absoluta na humanidade, que vive sobre os impactos da vida moderna. O cineasta não nos poupa e apresenta imagens cruéis, de caráter documental, de diversos crimes ambientais provocados pelo homem, como a poluição das fábricas nos ares e oceanos e uma chocante execução de um filhote de foca. 


Compreendemos que Charles está insatisfeito e se sentido à deriva, à margem de uma sociedade superficial e que dela ele não pode suprir nada. A política, a religião, os relacionamentos, a psicanálise, nada é o suficiente para fazer Charles abdicar do suicídio. 


O destino trágico do protagonista é mostrado nos minutos iniciais do filme e você não poderia se importar menos. Conhecemos muito pouco de Charles e sequer compreendemos muito bem que tipo de relação ele tem com os outros personagens. Durante a projeção você vai confundindo todos os apáticos e deprimidos/mentes atores e suas funções na narrativa, ainda que eles passem o filme inteiro com o mesmo figurino. 


Aliás, a interpretação monocórdica do elenco é de dar nos nervos. A dúvida é se eles são péssimos atores, se são não-atores ou se foi uma exigência do diretor. O jeito como as falas são dadas e como sua linguagem corporal é executada faz qualquer outro ator parecer um astro de novela mexicana. 


A falta de trilha-sonora contribui para o clima pesado e anêmico pretendido por Bresson, que utiliza o som ambiente para encruá-lo mais ainda. No entanto, os planos que por vezes enquadram os membros inferiores dos atores parecem só uma escolha que pretende chamar atenção para si próprio. 


O Diabo, Provavelmente é aquele longa de título curioso e super estranho que não se esforça para fazer o espectador se envolver em seu drama. Que tenta provocar reflexões que teriam tido mais êxito se fossem lidas numa sinopse qualquer.

Nenhum comentário:

Postar um comentário